Oficialmente, a novidade pretende oferecer apenas um meio rentável de distribuir conteúdo na internet. Mas, no meio do processo, o Facebook deve provocar uma mudança profunda no jornalismo – mais uma vez.

Reféns

Veículos de comunicação são atuais reféns do Facebook. Junto com o Google, a rede social detém cerca de 85% do investimento em publicidade online mundialmente. Antes, grande parte desse dinheiro ia para jornais, revistas e TVs. O impresso que migrou para o digital ainda tenta encontrar meios de financiamento que não dependam da filantropia que deu origem ao Huffington Post. Enquanto isso, a empresa de Mark Zuckerberg é uma aliada necessária. A queda na receita de publicidade e a necessidade pela audiência aproxima naturalmente as empresas de mídia do Facebook. Ao mesmo tempo, a busca por credibilidade força a rede social a estreitar os laços e a buscar novas formas de negócios para produtores de conteúdo jornalístico. Recentemente, porém, o projeto de jornalismo do Facebook gerou dúvidas e não vem agradando alguns gigantes. Além de interceptar a renda de publicidade e exigir conteúdo cada vez mais elaborado, a rede social mostra que quer controlar também a comunidade. Veículos de mídia são historicamente responsáveis por fazer a curadoria de conteúdo e escolher como o público consome. Mas, na era digital, o Facebook quer distribuir, receber os pagamentos, decidir o que aparece no feed e ainda saber quem é que paga por notícias. Os próprios usuários acabam fazendo uma tarefa ou outra, como deixar de seguir páginas e excluir assuntos desinteressantes. Mas, no fim, nada sai do controle da empresa de Zuckerberg.

Projeto Facebook Jornalismo

Sob o guarda-chuva do Facebook Journalism Project, a plataforma Instant Articles vem dando certo em termos de números. Segundo o Facebook, nos primeiros seis meses de atividade do projeto, veículos de mídia acumularam 2 milhões de assinantes e aumentaram a audiência na rede social em 50%. São cerca de US$ 1 milhão por dia pagos pelo Facebook em anúncios exibidos nos artigos de mais de 10 mil veículos. Por enquanto, entretanto, é impossível saber a distribuição desses rendimentos. Mark Zuckerberg confirmou os planos do Facebook na última semana. O objetivo é criar um sistema de paywall similar ao já usado por sites jornalísticos, só que dentro do feed. Usuários teriam direito a uma quantidade limitada de acesso mensal, e partir daí precisariam pagar uma assinatura. Segundo o Facebook, o dinheiro será encaminhado dos assinantes diretamente para os veículos, sem cota pela intermediação. Se a medida funcionar como prometido, a rede social pode solucionar um problema de usabilidade e operar, para as notícias, do jeito que a Netflix faz para séries de TV. Na nova fase do Facebook Jornalismo, lançado em janeiro deste ano, só veículos que já utilizam o Instant Articles poderão aderir ao modelo de assinatura. Isso quer dizer que, além de páginas com carregamento rápido, o pequeno raio ao lado do título poderá indicar, em breve, uma matéria pela qual você precisará pagar para ler.

Assinatura

O teste do novo modelo de assinaturas começa ainda em 2017 com veículos nos EUA e Europa. A tendência é que, com o tempo, o recurso seja estendido a outros países, como o Brasil. A novidade promete consertar alguns problemas dos Instant Articles, que sofrem críticas por gerarem faturamento baixo de publicidade – apesar de ter havido recente incremento nos banners para aumentar a arrecadação. Com as assinaturas controladas pelo Facebook, jornais e sites de notícias poderão aproveitar uma quantidade crescente de assinantes atraídos por uma plataforma fácil de usar. Mas, aos poucos, as empresas de mídia perdem dados importantes sobre quem é a sua audiência pagante. Essa informação valiosa vai para o Facebook, que poderá explorá-la como quiser. E os jornais deixam de aproveitar a base de clientes para meios alternativos de faturar. Se o modelo de assinaturas der errado, o jornalismo deverá continuar precisando das migalhas de publicidade da rede social. Se der certo, haverá ainda mais dependência do Facebook para distribuir conteúdo. Nos dois casos, Mark Zuckerberg parece ter seus reféns devidamente sob controle.

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